sábado, 27 de junho de 2009

Escultor de palavras








Se perguntarmos, por exemplo, o que é uma casa, todos respondemos de forma diferente. Uns dirão que é um edífico; outros que é um conjunto de pessoas, lembranças, factores, cheiros, plantas ou animais. Saramago responde que para Baltasar Sete-Sóis e Blimunda Sete-Luas era olharem-se; que para Jesus era estar acompanhado por Maria de Magdala e que para Ricardo Reis era um lugar de trânsito e de vida em suspenso.
Saramago, através do edifício, revela sempre as intimidades da vida quotidiana, a grandeza e a fragilidade da vida. Saramago também é poeta!

Convido-vos à leitura de alguns dos seus poemas.


Aprendamos, Amor
Aprendamos, amor, com estes montes
Que, tão longe do mar, sabem o jeito
De banhar no azul dos horizontes.

Façamos o que é certo e de direito:
Dos desejos ocultos outras fontes
E desçamos ao mar do nosso leito.



As palavras são novas
As palavras são novas: nascem quando
No ar as projectamos em cristais
De macias ou duras ressonâncias

Somos iguais aos deuses, inventando
Na solidão do mundo estes sinais
Como pontes que arcam as distâncias.


No silêncio dos olhos
Em que língua se diz, em que nação,
Em que outra humanidade se aprendeu
A palavra que ordene a confusão
Que neste remoinho se teceu?
Que murmúrio de vento, que dourados
Cantos de ave pousada em altos ramos
Dirão, em som, as coisas que, calados,
No silêncio dos olhos confessamos?



Poema à boca fechada
Não direi:
Que o silêncio me sufoca e amordaça.
Calado estou, calado ficarei,
Pois que a língua que falo é de outra raça.

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